segunda-feira, 22 de agosto de 2011

O princípio da oralidade e o sistema recursal nos Juizados Especiais

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O princípio da oralidade e o sistema recursal nos Juizados Especiais

Alexandre Freitas Câmara

Palavras-chave: Princípio da oralidade. Juizados Especiais Cíveis. Lei nº 9.099/1995.

Sumário: 1 Introdução - 2 O Princípio da oralidade e os Juizados Especiais Cíveis - 3 O sistema recursal dos Juizados Especiais Cíveis -4 O princípio da oralidade e a apelação nos Juizados Especiais Cíveis - 5 Conclusão

1 Introdução

Tenho, desde sempre, afirmado minha convicção no sentido de que todo o sistema dos Juizados Especiais Cíveis deve ser compreen­dido a partir dos princípios elencados no art. 2º da Lei nº 9.099/1995. Isto vale, evidentemente, para todos os institutos tratados no sistema dos Juizados Especiais, sejam eles estaduais ou federais, versando a causa neles deduzida sobre direito privado ou direito público.

Consequência direta disso é que os princípios referidos se apli­­­cam, também, ao sistema recursal estabelecido para os Juizados Especiais Cíveis. O que se pretende, com este ensaio, é demonstrar que, como con­sequência inexorável disso, não podem as Turmas Recursais, no exercício de sua competência recursal, reexaminar provas, limitando-se a devolu­ção operada às questões de direito, em razão da absoluta necessidade de respeito ao princípio da oralidade.

2 O Princípio da oralidade e os Juizados Especiais Cíveis

Um dos princípios mencionados no art. 2º da Lei nº 9.099/1995 é o da oralidade. Dentre todos aqueles princípios, este sempre me pareceu o mais relevante na determinação do modo como o processo deve se desenvolver perante esses órgãos jurisdicionais.

Digo isto porque os outros princípios, como o da informalidade e simplicidade e o da economia processual exercem, no sistema dos Juizados Especiais Cíveis, em minha opinião, apenas uma (e relevantíssima) função: atuam como vetores hermenêuticos, indicando a direção correta a ser seguida pelo intérprete das disposições das três leis que compõem aquilo que venho, sistematicamente, chamando de Estatuto dos Juizados Especiais. Assim, por exemplo, o princípio da economia processual permite ao intérprete compreender porque, no sistema dos Juizados Espe­ciais Cíveis, a citação por oficial de justiça se faz independentemente da expedição de mandado; do mesmo modo, o princípio da celeridade per­mite ao intérprete saber a razão pela qual existem os prazos recur­sais, nos processos que tramitam perante Juizados, costumeiramente são menores do que os estabelecidos para os processos que tramitam perante os juízos comuns.

O princípio da oralidade, porém, não obstante exercer também essa função, estabelece a técnica a ser observada no processo que tramita perante um Juizado Especial.

Para que se possa compreender melhor como se dá essa fixação da técnica, porém, impende ter uma noção mais precisa do que seja oprincípio da oralidade.

Impõe-se ter claro, em primeiro lugar, que a expressão processo oral não designa um sistema processual no qual seja proibida - ou impos­sível - a utilização da escrita. Oralidade (assim como escritura) designa um "modelo processual", em que são observados alguns postulados. A maior ou menor adesão a estes postulados é que permitirá afirmar que um determinado sistema processual é oral ouescrito.

Os postulados que compõem a oralidade processual são cinco preva­­­­lên­­­cia da palavra falada sobre a escrita; imediatidade entre o juiz e as fontes de prova; identidade física do juiz; concentração dos atos processuais em audiên­­­­cia e irrecorribilidade em separado das decisões interlocutórias.

Ao incluir o princípio da oralidade entre os princípios nortea­­­ dores do sistema dos Juizados Especiais Cíveis, a Lei nº 9.099/1995 impõe, pois, antes de tudo, que no processo que ali tramita prevaleça a palavra falada sobre a escrita. Daí decorrem, então, fenômenos como a possibilidade de ajuizamento oral da demanda (com sua redução a escrito pela secretaria do Juizado, que pode se valer de fichas ou formulá­ rios impressos); o oferecimento oral da resposta; a possibilidade de oposição oral de embargos de declaração; o requerimento verbal de execução da sentença. Não se elimina, por óbvio, a palavra escrita. Mas a palavra oral deve, ao menos em tese, prevalecer.1

No processo oral dos Juizados Especiais Cíveis deve-se observar, também, a necessidade de contato imediato entre o juiz e aqueles que prestam depoimento (sejam as partes, sejam as testemunhas), deve haver um contato imediato. Às partes se deve assegurar, assim, o direito a um day in the Court.2 De outro lado, é fundamental que o juiz tenha contato imediato com a testemunha, de forma a poder mais bem avaliar o con­teúdo de seu depoimento. No processo que tramita nos Juizados Espe­ ciais Cíveis (e, registre-se, também no processo que tramita perante os juízos comuns) o direito brasileiro estabelece que os depoimentos são tomados perante o juiz, o que permite afirmar a plena observância desse postulado.

De nada adiantaria, porém, esse contato imediato entre o juiz e as fontes da prova oral se não se observasse, também, a identidade física do juiz que colhe essa prova oral. Por conta disso é que o juiz que preside a audiência de instrução e julgamento e colhe a prova oral fica vin­cu­­ lado ao processo para o fim de proferir sentença.

Aqui é fundamental observar que não se aplica ao processo dos Juizados Especiais Cíveis o disposto no art. 132 do Código de Processo Civil, que afasta a vinculação do juiz que encerrou a colheita da prova oral. Nos Juizados Especiais Cíveis, o juiz só deixa de estar vinculado se deixa o próprio exercício da magistratura. Isto, porém, não deveria ser um problema, já que, nos termos do disposto no art. 28 da Lei nº 9.099/ 1995, na audiência de instrução e julgamento serão ouvidas as partes, colhida toda a prova e, em seguida, proferida a sentença. Ora, se a sentença será proferida na própria audiência em que a prova oral é produzida, não há, evidentemente, qualquer problema em se estabelecer um sistema de total vinculação do juiz ao processo, sem previsão de qualquer exceção.3

Para que tudo isso funcione bem, impõe-se, ainda, a observância do postulado segundo o qual os atos processuais devem ser concentrados em uma audiência ou, no caso de haver necessidade de realização de mais de uma delas, estas deverão realizar-se com o menor intervalo de tempo possível. Isto é fundamental diante do fato de que, prevalecendo a palavra falada sobre a escrita, é preciso criar mecanismos que auxiliem o juiz a decidir enquanto ainda preserva em sua memória os fatos prin­cipais ocorridos durante a tramitação do processo. Este é o postulado que legitima a conversão da sessão de conciliação em audiência de instrução e julgamento, sempre que de tal conversão não resulte prejuízo para a defesa.

3 O sistema recursal dos Juizados Especiais Cíveis

O sistema de recursos dos processos que tramitam perante os Juizados Especiais Cíveis é, como não poderia deixar de ser, mais simples do que o do processo que tramita perante os juízos comuns. Em linhas gerais, e simplificadamente, costuma-se afirmar que esse sistema só contém três recursos: "recurso inominado", embargos de declaração e recurso extraordinário.

A rigor, porém, o sistema recursal dos Juizados é ainda um pouco mais complexo (e completo) do que isso. Na verdade, os recursos cabí­veis nos processos que tramitam perante os Juizados Especiais Cíveis são os seguintes: apelação, agravo, embargos de declaração, recurso extraordinário e embargos de divergência. É preciso, porém, explicar um pouco melhor o que acaba de ser dito.

Em primeiro lugar, a Lei nº 9.099/1995 prevê o cabimento de re­curso contra a sentença. A prática forense consagrou o uso da denominação "recurso inominado" para este recurso. Sempre afirmei, porém,4 que na verdade o que se tem aí é a apelação. É preciso insistir nesse ponto: a lei dos Juizados Especiais Cíveis não criou um novo recurso contra as sentenças. O que ela fez foi afirmar que contra a sentença é cabível a interposição de recurso. E este recurso só pode ser o cabível contra as sentenças em geral: apelação.

Não impressiona o fato de ser o recurso cabível nos Juizados Especiais Cíveis em dez dias, e não em quinze (como se dá no sistema do Código de Processo Civil). Basta dizer que - tratando dos Juizados Criminais - a própria Lei nº 9.099/1995 admite o cabimento de apelação em dez dias (art. 82, §1º). Também não impressiona o fato de o recurso não ser julgado pelo Tribunal de Apelações, mas pela Turma Recursal. O mesmo se passa nos Juizados Criminais, e nessa sede a lei é expressa em afirmar que o recurso é o de apelação (art. 82, caput).

Poder-se-ia perguntar por que o legislador não chamou expres­samente esse recurso de apelação. Esta, porém, é uma daquelas perguntas para as quais não há respostas adequadas. Ao intérprete do sistema, porém, isso não pode interessar (ainda mais pelo fato de que o legislador tampouco deu ao recurso qualquer outro nome). O importante é o exame da essência do instituto, e não pode haver dúvidas de que o recurso cabível contra sentença é - receba da lei expressamente esse nome ou não - a apelação.

Afirmei ser cabível também nos Juizados Especiais Cíveis o recurso de agravo. Isto precisa ser mais bem esclarecido.

Ao determinar a incidência do princípio da oralidade no processo dos Juizados Especiais Cíveis, a Lei nº 9.099/1995 estabeleceu que nesse microssistema processual seriam irrecorríveis as decisões interlocutó­­ rias. Ocorre que, posteriormente, a lei que regulou os Juizados Fede­rais (Lei nº 10.259/2001) foi expressa em afirmar, em seu art. 5º, o cabimento de recurso contra a decisão acerca do cabimento ou não de tutela de urgência.

Sempre sustentei a necessidade de se tratar as diversas leis que tratam de Juizados Especiais como se compusessem um só microssis­tema. Tenho sempre afirmado que essas leis, juntas, compõem o Estatuto dos Juizados Especiais, ideia que acabou por ser acolhida expressamente pelo legislador quando da elaboração da lei que rege os Juizados Especiais da Fazenda Pública (que fala de um sistema dos Juizados).

Admitida a existência desse microssistema composto pelas três leis que regem o processo nos Juizados Especiais, é de se admitir, também, o constante diálogo entre esses três diplomas legislativos. É o que, em doutrina, convencionou-se chamar de diálogo das fontes.

Assim sendo, a partir do momento em que uma dessas leis admite o cabimento de agravo contra um determinado tipo específico de decisão interlocutória, essa possibilidade se espalha pelas outras leis que integram o Estatuto dos Juizados Especiais.5

É preciso, pois, admitir o cabimento de agravo (que será inter­posto por instrumento) contra a decisão que defere ou indefere tutelas de urgência (cautelares ou antecipatórias de tutela). E, por não haver nas leis que compõem o Estatuto dos Juizados Especiais qualquer disposição acerca da forma como esse agravo será interposto, aplicar-se-ão, em caráter subsidiário, as regras do Código de Processo Civil acerca dessa espécie recursal.

Além da apelação e do agravo, o microssistema processual dos Juizados Especiais admite a oposição de embargos de declaração contra decisões obscuras, contraditórias ou omissas.6 Estes são cabíveis, sempre, no prazo de cinco dias, podendo ser opostos por escrito ou oralmente. O oferecimento de embargos de declaração tempestivos contra sent­ença suspende o prazo para a interposição de apelação, por qualquer das partes.7 Já quando interpostos contra acórdão, os embargos de decla­ ração interrompem o prazo para oferecimento de outros recursos.8

Contra acórdãos das Turmas Recursais admite-se - desde que preenchidos todos os requisitos, inclusive os específicos, como o pre­questionamento e a repercussão geral da questão constitucional - o recurso extraordinário, a ser julgado pelo STF. E da decisão proferida pelo STF pode, desde que preenchidos os requisitos de sua admissibili­dade, ser interposto o recurso de embargos de divergência.9

4 O princípio da oralidade e a apelação nos Juizados Especiais Cíveis

De um modo geral, a determinação contida na lei no sentido de que se reja o processo dos Juizados Especiais Cíveis pelo princípio da oralidade não produz qualquer consequência sobre o modo como se desenvolvem os recursos. Exceções a isso, porém, encontram-se no trato da apelação e do agravo. Este estudo fica centrado na influência que o princípio da oralidade exercerá sobre o funcionamento da apelação nos Juizados Especiais Cíveis, mas o leitor atento saberá determinar as consequências que, mutatis mutandis, se operarão sobre o agravo.

É costume afirmar-se, em sede de doutrina, que a apelação é o recurso por excelência.10 É que a apelação é o recurso que permite observar-se, de forma plena, o princípio do duplo grau de jurisdição, provocando um reexame completo da causa, tanto no que diz respeito à matéria de direito quanto no que concerne à matéria de fato.11

Pois é exatamente este raciocínio que tem levado a que se sustente, a meu ver de modo equivocado, que na apelação cabível nos processos dos Juizados Especiais Cíveis é possível às Turmas Recursais o reexame das questões de fato e de direito.

É preciso dizer, antes de tudo, que é perfeitamente possível admitir-se a previsão, em um sistema processual, do cabimento de apelação apenas para que se provoque o reexame de matéria de direito, subme­tida a análise das questões de fato a um único grau de jurisdição.12 Além disso, é sempre preciso ter claro que o reexame das questões de fato pelo órgão competente para conhecer do recurso pressupõe, necessariamente, que este tenha à sua disposição as mesmas condições para atuar que o órgão originariamente competente para a causa. Sobre o tema, vale mencionar importante lição doutrinária: "A possibilidade de o tribunal de recurso conhecer de matéria de facto (além de, claro está, apreciar matéria de direito) pressupõe que a esse tribunal são garantidas, pelo menos, as mesmas condições que estão asseguradas ao tribunal recorrido. O problema assume especial acuidade no que se refere à oralidade e imediação, pois que - dir-se-á com alguma razão -, se estas contribuem decisivamente para o bom julgamento da causa (em especial, no que se refere à apreciação da matéria de facto), parece contraditório com a função dos tribunais de recurso retirar-lhes os benefícios delas decorrentes".13

Em um sistema processual como o estabelecido pelo Código de Processo Civil, em que a oralidade não é o modelo de processo adotado,14 não há maiores problemas na admissão de um novo juízo sobre os fatos a ser realizado pelo tribunal recursal. Afinal, todo o reexame dos fatos empreendido pelo tribunal de apelação se faz sobre escritos (aí incluído o termo dos depoimentos tomados no juízo inferior).15

O mesmo não se dá, todavia, em um sistema de oralidade pro­­ ces­sual, como é o dos Juizados Especiais Cíveis. Neste sistema, a Turma Recursal, ao julgar a apelação, fica necessariamente vinculada aos prin­cípios norteadores do processo nos Juizados, estabelecidos pelo art. 2º da Lei nº 9.099/1995.

Assim sendo, é de se considerar que no desenvolvimento do pro­cedimento recursal, fica a Turma vinculada aos postulados que compõem o princípio da oralidade. Dessa afirmação é que se extrai a impossibili­dade de que a Turma Recursal reexamine questões de fato. É que, ao fazê-lo, a Turma Recursal terá apreciado e valorado provas que não colheu, notadamente (ainda que não exclusivamente) as provas orais. Afinal, caso valore as provas produzidas pelo Juizado de origem, a Turma Recursal incidirá no equívoco de desconsiderar o postulado que impõe, em um processo oral, a imediatidade entre o juiz e as fontes de prova.

Isto se diz porque, num sistema de processo oral, precisa-se ter sempre presente a ideia de que o juiz do fato é o juiz que colhe a prova. E se é assim, não se pode admitir que, em grau recursal, haja uma nova valo­ ração da prova, sob pena de se comprometer todo o sistema.

5 Conclusão

De tudo quanto se expôs, a única conclusão possível é esta: a prática já consagrada, de permitir à Turma Recursal o reexame integral da matéria em sede de apelação, inclusive quanto à matéria de fato, contraria o disposto no art. 2º da Lei nº 9.099/1995, revelando-se incompatível com o modelo processual inspirado na oralidade que se construiu para os Juizados Especiais Cíveis. Pode-se concordar ou não com a opção do legislador; pode-se considerar que esta leva a resultados melhores ou piores do que os que seriam alcançados com a adoção de outro sistema. O que não se pode é, simplesmente, desconsiderar-se a escolha conscien­temente feita pelo Estatuto dos Juizados Especiais, tratando-se o processo que tramita perante estes tão importantes órgãos jurisdicionais como se fossem processos ordinários, desses que tramitam nos juízos comuns, regidos pelo Código de Processo Civil. Essa desconsideração pela escolha do legislador é perniciosa e deve, por isso, ser a todo custo combatida.

1 Digo em tese porque, como sabem todos os que têm experiência prática nos Juizados Especiais Cíveis, raramente os atos das partes são orais. Petições iniciais, contestações, embargos declaratórios, requerimentos executivos, tudo isso se costuma fazer por escrito, como se fossem destinados aos juízos comuns.

2 Trata-se do direito, costumeiramente reconhecido nos sistemas jurídicos de origem anglo-saxônica, a um "dia perante o Tribunal". Não posso, porém, deixar de registrar que a tendência, mundialmente observada, de uso de novas tecnologias no processo judicial pode levar a que as audiências se realizem através da técnica da videoconferência, o que reduziria bastante essa garantia. Não obstante a inexorabilidade do uso das novas técnicas, penso que se deve receber com cuidado algumas inovações, sob pena de se provocar uma "desumanização" do processo, com o fim do contato pessoal, substituído por contatos virtuais.

3 Tudo isso, porém, se diz apenas em tese. É que, na prática, houve um total desvirtuamento do sistema. Os juízes que atuam nos Juizados Especiais Cíveis, inexplicavelmente, não proferem suas sentenças na audiência. Levam os autos conclusos para sentença, aplicando uma regra contida no Código de Processo Civil que permite ao juiz proferir a sentença no prazo de dez dias após o encerramento da audiência. Esta regra, contida no CPC, tem caráter geral, e não pode prevalecer sobre os precisos e claros termos do que consta no já citado art. 28 da Lei nº 9.099/1995. A prática está, como dito, inteiramente desvirtuada. Não só as sentenças não são proferidas desde logo, como determina a lei, mas - para piorar ainda mais - ainda se designam "audiências de leitura de sentença". Essas audiências - que são, a rigor, falsas audiências, pois não se realizam na verdade, com as partes tão somente comparecendo à secretaria do Juizado para tomar conhecimento do teor da decisão - além de tudo, contrariam ainda um outro princípio, o da celeridade processual, também estabelecido no art. 2º da lei entre os que norteiam o processo nos Juizados Especiais Cíveis.

4 Isso consta - como todas as minhas outras opiniões anteriormente manifestadas sobre Juizados Especiais Cíveis - do livro em que faço uma exposição sistemática do microssistema processual dos Juizados. Cf., pois, Alexandre Freitas Câmara. Juizados especiais cíveis estaduais, federais e da Fazenda Pública: uma abordagem crítica. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. Passim.

5 Não posso, aqui, deixar de observar que deveria ter havido, também, a previsão de cabimento de agravo contra (algumas, pelo menos) decisões interlocutórias proferidas in executivis. A inadmissibilidade do agravo contra essas decisões - como, e.g., a que determina a penhora de um bem ou a que defere sua adjudicação leva ao uso - em tese inadequado, mas absolutamente justificável na prática forense, do mandado de segurança como sucedâneo recursal.

6 Duas observações precisam ser feitas neste ponto. A primeira é a de que também nos Juizados Especiais Cíveis se deve admitir a oposição de embargos de declaração contra decisões interlocutórias. A segunda é que se deve reputar como não escrita a afirmação, contida na Lei nº 9.099/95, de que os embargos de declaração seriam cabíveis quando na decisão houver dúvida. Isto se diz porque a dúvida é, na verdade, um estado subjetivo daquele que lê o teor da decisão, provocado por obscuridade, contradição ou omissão em seu texto.

7 Suspende, e não interrompe, diferentemente do que se dá no sistema do Código de Processo Civil.

8 Assim já decidiu o STF: AI no AgR nº 451078/RJ, rel. Min. Eros Grau, j. em 31.08.2004.

9 Deixo, aqui, por serem absolutamente irrelevantes para a compreensão do que se pretende sustentar neste ensaio, de apresentar quaisquer considerações sobre o cabimento - evidente, diga-se - de agravo contra a decisão que, na origem, deixa de admitir o recurso extraordinário interposto.

10 Esta frase já se tornou um verdadeiro lugar-comum. É a mesma empregada, entre outros, por Flávio Cheim Jorge (Apelação cível: teoria geral e admissibilidade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 51). Também outros doutrinadores brasileiros a empregam, como se vê, por exemplo, em José Carlos Barbosa Moreira (Comentários ao Código de Processo Civil. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. v. 5, p. 409). Na doutrina estrangeira mais autorizada, a mesma frase pode ser lida, e.g., em Loïc Cadiet e Emmanuel Jeland (Droit judiciaire privé. 5. ed. Paris: LexisNexis, 2006. p. 507) ("voie de recours ordinaire par excellence").

11 Neste sentido, Luigi Paolo Comoglio, Corrado Ferri e Michele Taruffo (Lezioni sul processo civile. 4. ed. Bolonha: Il Mulino, 2006. v. 1, p. 612).

12 Este é o sistema tradicionalmente adotado nos ordenamentos anglo-saxônicos, como já apontava Cappelletti em seu célebre "parecer iconoclástico". Cf., pois, Mauro Cappelletti (Dictamen iconoclástico sobre la reforma del proceso civil italiano. In: CAPPELLETTI, Mauro.Proceso, ideologías, sociedad. Trad. esp. de Santiago Sentís Melendo e Tomás A. Banzhaf. Buenos Aires: EJEA, 1974. p. 279-280). Impõe-se observar, porém, que no moderno direito processual inglês tem-se admitido, ainda que em casos excepcionais, que a Court of Appeal reexamine o material probatório ou até colha novas provas. Sobre o ponto, Neil Andews (O moderno processo civil. Trad. bras. orientada e revista por Teresa Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 194-197).

13 SOUSA, Miguel Teixeira de. Estudos sobre o novo processo civil. 2. ed. Lisboa: Lex, 1997. p. 399.

14 Venho já há bastante tempo sustentando que no sistema do Código de Processo Civil o que se adotou foi um modelo de "processo escrito mitigado". Sobre o ponto, seja permitido fazer referência ao que está escrito em Alexandre Freitas Câmara (A oralidade e o processo civil brasileiro. In: CÂMARA, Freitas. Escritos de direito processual: primeira série. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001. p. 22-29). Voltei ao tema, posteriormente, em Alexandre Freitas Câmara (A oralidade e o processo civil brasileiro: estado atual da questão. In: CÂMARA, Freitas. Escritos de direito processual: terceira série. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 60-66).

15 Na qualidade de integrante de um tribunal de segunda instância, não posso deixar de registrar aqui a dificuldade, que muitas vezes tenho, de valorar as provas que foram produzidas oralmente, já que não tive contato imediato com os depoentes. Aqui, porém, é preciso registrar o fato de que a adoção de novas tecnologias, com a gravação em arquivos audiovisuais das audiências, certamente modificará o modo como as Cortes Recursais se relacionam com a prova. Observou o ponto o processualista norte-americano Paul Carrington (Technology and civil litigation in the United States in the twenty-first century. In: KENGYEL, Miklós (Coord.). Electronic Justice: Present and Future. COLLOQUIUM OF THE INTERNATIONAL ASSOCIATION OF PROCEDURAL LAW. Pécs: University of Pécs Faculty of Law, 2010. p. 164), que narra um caso em que a Suprema Corte dos EUA, em um julgamento ocorrido em 2007, contrariando seu papel tradicional de revisora das questões de direito, reexaminou provas em um processo em que se tratava de responsabilidade civil pelos danos decorrentes de um acidente de trânsito que foi inteiramente filmado através de uma câmera que estava em um dos automóveis envolvidos.


Como citar este artigo na versão digital:

Conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:


CÂMARA, Alexandre Freitas. O princípio da oralidade e o sistema recursal nos juizados especiais.
Biblioteca Digital Revista Brasileira de Direito Processual - RBDPro, Belo Horizonte, ano 18, n. 72, out./dez. 2010. Disponível em: . Acesso em: 22 agosto 2011.

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